Dr. Roberto Luiz Marino

Email: rlmarino@cardiol.br

A ocorrência de Sangramento após ICP está relacionada com aumento da mortalidade precoce e tardia, alem de aumento de eventos cardíacos maiores: infarto do miocárdio(IAM), mortalidade por causa cardíaca e acidente vascular cerebral (AVC), e sua maior gravidade se relaciona com incremento na incidência desses desfechos desfavoráveis. Além da mortalidade, o sangramento está relacionado a maior tempo de permanência hospitalar, maiores riscos de recorrência de infarto, insuficiência renal e readmissão hospitalar.

1 – Definição de sangramentos

A Definição de sangramento apresenta diferenças de acordo com os critérios utilizados.

Em 1998, o estudo clínico TIMI utilizou critérios clínicos e laboratoriais para definir tipos de sangramento em pacientes com SCA com supradesnivelamento do ST (SCA CSST) submetidos a fibrinólise.

Em 1993, o estudo GUSTO também avaliou o sangramento após trombo lise em paciente com SCACSST.

Diante das várias definições e dificuldades de padronização e limitações de comparabilidade em 2005 a Sociedade Internacional de Trombose e Hemostasia (ISTH), definiu novos critérios para sangramento maior.

ISTH: International Society on Thrombosis and Haemostasis

Em 2011 foi criado um grupo de trabalho com especialistas no tema, com a elaboração de um novo consenso para padronizar a Classificação do sangramento, o denominado Bleeding Academic  Research Consortium (BARC), também com a inclusão de sangramento associado à cirurgia de revascularização miocárdica (CRVM). Nessa classificação estratifica-se a gravidade do sangramento em uma escala de O(ausência de sangramento) e 5(sangramento fatal). O sangramento é considerado fatal quando tem associação direta com o óbito. (P.Ex. sangramento de trato GI com choque hemorrágico). Em casos de associação indireta, o sangramento não deve ser considerado como fatal (P.Ex. Trombose de Stent ocasionando choque cardiogênico e óbito em pacientes com sangramento que motivou a suspensão de antitrombóticos)

O consenso BARC foi amplamente validado prospectivamente em diversos ensaios clínicos. Sua análise foge ao objetivo desta sucinta revisão.

INCIDÊNCIA E SÍTIO DE SANGRAMENTO

A estimativa da incidência de sangramento é variável devido ás múltiplas definições utilizadas.

Estudos com SCA tem indicado ocorrência variável 4% a 15% (todos sangramentos) e 2% a 10%(sangramentos maiores), variação ampla de acordo com o estudo e a classsificação utilizada.

Sítios mais freqüentes para sangramentos maiores, em ordem decrescente:

– acesso femoral – 30% a 60%

– Trato Gastrointestinal – 10% a 15%

– Retroperitoneal – 5% a 12%

– Trato genito urinário – 3% a 5%

– Intracraniano – 2% a 3%

– Pulmonar – 1% a 2%

Fatores de Risco de Sangramentos

– Fatores NÃO MODIFICÁVEIS

            – Sexo Feminino

            – Baixo índice de massa corporal

            – Anemia Prévia

            – Doença Renal Crônica

            – Hipertensão arterial sistêmica

            – Uso prévio de anticoagulantes

            – História prévia de sangramento

– Fatores ASSOCIADOS

            – Apresentação como SCA

            – Acesso via femoral

            – Duração e complexidade  do procedimento

            – Uso de inibidos GP IIb/III

            – Uso de trombolíticos

            – Uso de Balão Intra-Aórtica

– Escores de Risco de Sangramento

Diversos escores de risco de sangramento foram propostos a partir de 2007, em diversos estudos clínicos: REPLACE, ACUITY E HORIZONT. Foge aos nossos objetivos uma análise mais pormenorizada dos diversos escores.

Em 2009, o Escore CRUSADE derivado de um registro nacional nos EUA, com 71277 pacientes com SCASSST, foi introduzido, com o objetivo de avaliar risco de Sangramento maior intra-hospitalar. Diversos fatores de risco foram definidos e de acordo com a Soma dos pontos do escore o paciente é classificado em:

Muito Baixo risco de sangramento (pontuação 1-20, risco de sangramento de 3,1%

Baixo Risco (pontuação de 21-30, risco de sangramento de 5,5%)

Moderado Risco (pontuação de 31-40, risco de sangramento de 8,5%)

Alto Risco (pontuação de 41-50, risco de sangramento de 11,9%)

Muito Alto Risco (pontuação >50, risco de sangramento de 19,5%)

O CRUSADE foi amplamente validado, com pacientes mais próximos do “mundo real”, sendo recomendado pelas diretrizes médicas atuais (AHA/ACC/ESC).

Diagnóstico de Sangramento

O diagnóstico do sítio de sangramento na maioria das situações é muito evidente, quando exteriorizado como sangramento do sítio de punção vascular, hematúria, hematemese, hematoquezia ou melena. Também pode ser desafiador como em situações de sangramento retroperitoneal, que pode se apresentar com colapso circulatório agudo sem exteriorização do sangramento.  O sangramento retroperitoneal pode se apresentar com quadro de dor abdominal, lombar, queda da hemoglobina sem foco aparente de sangramento, hipotensão ou choque. Em pacientes obesos ou na suspeita de complicações com aneurisma ou pseudoaneurisma, deve ser complementado com ultrassom ou Doppler.

Estar atendo para quadros de cefaléia, náuseas, vômitos, tontura, confusão mental, que podem sinalizar para diagnóstico diferencial de AVC hemorrágico.

A tomografia é utilizada para o diagnóstico e a angiografia pode ser utilizada para o local de sangramento, podendo ser utilizada para o tratamento com insuflação de balão proximal ao ponto de lesão vascular.

Prognóstico de Sangramento

Vários estudos, especialmente com pacientes com SCA mostram que o sangramento é um fator de risco isolado para mortalidade geral, com chances de óbitos de 3 a 10 vezes maiores em comparação aos pacientes que não desenvolvem sangramentos, também em alguns casos pode estar apenas refletindo a maior gravidade do paciente (marcador de risco).

Em análise do banco de dados do grupo OASIS, em avaliação de 34166 pacientes com SCA, o sangramento maior se associou com aumento de 5 vezes na razão de chances para o óbito global em 30 dias (12,5% X 2,5%) e mantendo a diferença entre 30 dias e 6 meses (4,62% x 2,9%)

O impacto prognóstico apresenta relação nítida entre a magnitude ou a gravidade de sangramento e os desfechos clínicos desfavoráveis. Há estudos que demonstram aumento de mortalidade desde os sangramentos BARC > 2.

Em algumas situações diante do sangramento é necessário a transfusão de hemoderivados ou a suspensão de antitrombóticos, sendo ambas as condições relacionadas a aumento do risco de mortalidade. Em avaliação do estudo CRUSADE 10% dos pacientes com sangramento grave necessita transfusão, tendo ocorrido aumento de mortalidade nos pacientes que receberam hemoderivados(11,5% x 3,8%, OR 1,67).

Mecanismos prováveis para o aumento de mortalidade e morbidade relacionado ao sangramento.

A seguir vamos rever alguns dados do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia obtidos de registro de SCACSST e SCASST realizados nos anos 2017 e 2018, prospectivamente em 363 pacientes, objeto de dissertação de mestrado de Caio Simões Souza, apresentada no ano de 2019;

Dados do Instituto Dante Pazzanese – 2019

SCA: 363 Pacientes

Via de acesso/Sangramento

Sangramento/Desfechos Hospitalares

DesfechosSangramento  n=69Sem sangramento n=294p
Óbito8,7%3.1%0,04
EAP8,7%2,4%0,02
IRAa27,5%18%0,09

EAP: edema agudo pulmonar; IRA: Insuficiência renal aguda. Definida como aumento de creatinina em 0,3mg/dl ou 50% em relação ao basal.

Referências:

– Journal of ACC 1988, 11(1): 1-11

– The New England Journal of Medicine 1993; 329(10):673-82

– JACC Cardiovascular Interventions 2011; 4(6): 654-64

– JTH 2005; 3 (4): 692-4

– Circulation 2011; 123(23): 2736-47

– Journal of ACC 2014; 64(24): e 139 e 228

– Giornale Italiano de Cardiologia 2016; 17(10): 831-72

– Circulation 2009;119(14): 1873-82

– Archives of internal medicine 2003; 163(19):2345-53

-IDPC – SP;2019 Dissertação Mestrado Caio Simões Souza