Dr. Walter Rabelo

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Diabetes Mellitus tipo 2 e insuficiência cardíaca: uma declaração científica da American Heart Association e da Heart Failure Society of America. 

1. Mais de 29 milhões de adultos nos Estados Unidos têm diabetes mellitus não dependente de insulina (DM), enquanto 6,5 milhões têm Insuficiência cardíaca (IC), e ambas as condições devem continuar a aumentar em prevalência ao longo do tempo. Em coortes de IC, incluindo tanto IC com fração de ejeção reduzida (ICFER) quanto IC com fração de ejeção preservada (ICFEP), a prevalência de DM varia de 10% a 47%. A prevalência de DM é maior em pacientes hospitalizados com IC, com alguns relatos de até 40%. Nos pacientes com DM, a prevalência de IC situa-se entre 9% a 22%, que é 4 vezes maior que na população geral, e a prevalência é ainda maior em pacientes com DM com idade ≥60 anos.

2.Estudos observacionais mostraram um aumento de duas a quatro vezes no risco de IC em indivíduos com DM em comparação com aqueles sem DM. O risco de IC é aumentado mesmo com anormalidades mais brandas na regulação da glicose.O comprometimento metabólico é intrínseco à fisiopatologia da IC e a resistência à insulina está presente em até 60% dos pacientes com IC. O DM pode contribuir para a IC através de mecanismos sistêmicos, miocárdicos e celulares, resultando em isquemia / infarto, cardiomiopatia diabética e hipertrofia ventricular esquerda.

3. O controle glicêmico intensivo não parece reduzir o risco de mortalidade por todas as causas, mortalidade cardiovascular ou acidente vascular cerebral; no entanto, pode reduzir o risco de infarto do miocárdio não fatal. Os níveis da hemoglobina glicada deve ser individualizado em pacientes com IC e DM com base no estado clínico / funcional do paciente (expectativa de vida, comorbidades, presença de complicações do DM), história de hipoglicemia, capacidade de autocuidado  e a carga global do tratamento .

4.É razoável o uso de metformina em pacientes com DM em risco de ou com IC estabelecida, contanto que a taxa de filtração glomerular estimada seja superior a 30 ml / min / 1,73 m². A metformina deve ser descontinuada em pacientes com quadros agudos associados à acidose láctica, como choque cardiogênico ou distributivo. A metformina e os inibidores SGLT-2 (cotransportador de glicose sódica tipo 2), são preferíveis ao uso de sulfoniluréias em pacientes com alto risco para IC e aqueles com IC estabelecida.

5.Às vezes, a insulina é necessária para alcançar o controle glicêmico adequado em indivíduos com DM e IC. O uso de insulina está associado ao ganho de peso e risco de hipoglicemia e deve ser usada com cautela e monitoramento rigoroso. Outros agentes, como metformina e inibidores de SGLT-2, são preferidos se o controle glicêmico adequado puder ser alcançado sem a insulina.

6.As tiazolidinedionas não são recomendadas em pacientes com IC estabelecida e podem aumentar o risco de eventos de IC em indivíduos com DM sem IC. Não existe evidência de que os inibidores da dipeptidil peptidase-4 (DPP-4) proporcionem benefícios cardiovasculares. Em pacientes com DM de alto risco cardiovascular, alguns inibidores da DPP-4 poderiam aumentar o risco de hospitalização por IC. Com base em estudos mecanísticos, o equilíbrio risco-benefício para a maioria dos inibidores da DPP-4 não justifica seu uso em pacientes com IC estabelecida ou naqueles com alto risco para IC.

7.Os inibidores de SGLT-2 são a primeira classe de agentes redutores de glicose que demonstraram reduzir o risco de hospitalização por IC em pacientes com DM. Os benefícios cardiovasculares dos inibidores de SGLT-2 devem ser considerados com seus riscos potenciais, incluindo candidíase genital e outros, complicações potenciais raras, como cetoacidose diabética euglicêmica, amputação de membros inferiores e fraturas (as duas últimas complicações foram observadas apenas com canagliflozina).

8.O manejo de DM e IC pode ser particularmente desafiador em pacientes com função renal gravemente reduzida. Em pacientes com RFG <30 ml / min / 1,73 m² a insulina é segura, mas pode exigir doses menores e monitoramento frequente. Outros agentes selecionados, incluindo glimepirida, glipizida, inibidores da DPP-4 e agonistas selecionados do receptor de GLP-1, podem ser considerados, mas devem ser usados ​​com cautela e podem requerer ajuste de dose.

9. Dada a força dos dados sobre os benefícios dos inibidores do sistema renina-angiotensina-aldosterona, inibidores do receptor de angiotensina-neprilisina, betabloqueadores, ivabradina e cardioversor-desfibrilador implantável e a terapia de ressincronização cardíaca na ICFER independentemente do status de DM, essas terapias devem rotineiramente ser implementadas em pacientes com DM e IC que atendam às indicações das diretrizes. Como os principais estudos de IC com inibidores da enzima conversora da angiotensina e bloqueadores dos receptores da angiotensina excluíram pacientes com disfunção renal grave, pouco se sabe sobre sua segurança nessa população.

10. O exercício é seguro e benéfico em pacientes com IC e DM. Pacientes encaminhados para reabilitação cardíaca devem ser orientados sobre a importância da adesão ao treinamento. Em pacientes com ICFEP e obesidade, muitos dos quais também têm DM,um programa combinado de dieta e exercícios pode melhorar a capacidade funcional.

11. A consulta endocrinológica é fortemente recomendada para pacientes com IC, DM e controle glicêmico inadequado.

Palavras Chave: Glicose Sanguínea, Reabilitação Cardíaca, Terapia de Ressincronização Cardíaca, Desfibriladores, Implantáveis, Diabetes Mellitus, Tipo 2, Cardiomiopatias Diabéticas, Insuficiência Cardíaca, Hipertrofia, Ventricular Esquerdo, Hipoglicemia, Resistência à Insulina, Síndrome Metabólica X, Metformina, Infarto do Miocárdio, Obesidade, Prevenção Primária, Qualidade de Vida, Fatores de Risco, Acidente Vascular Cerebral.

Referência: Circulation. 2019;139:00–00. DOI: 10.1161/CIR.0000000000000691