Dr. Walter Rabelo
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Angioplastia coronária Passado e Presente
Marcos A. Marino,¹ Bruno Ramos,² Alexandre J.Vasconcelos,²Luis Eduardo Couto,² Hugo Frota,² Roberto Marino,³ Bárbara Marino4, Walter Rabelo4
¹Coordenador do Departamento de Hemodinâmica,² Hemodinamicista,³ Diretor do Departamento de Cardiologia,, 4 Coordenador do departamento de Cardiologia
As contribuições da hemodinâmica e do cateterismo cardíaco no Brasil tem sido significativa desde 1946. Neste ano, Horácio Kneese de Melo publicou na Revista Paulista de Medicina, artigo intitulado “Angiocardiografia”, inaugurando a literatura nacional sobre cateterismo cardíaco. Depois de revisto e acrescido de aspectos técnicos e de interpretação diagnóstica, o mesmo foi divulgado em conjunto com seus colaboradores nos Arquivos Brasileiros de Cardiologia em 1949, motivando mais amplamente na comunidade cardiológica nacional o interesse pela nova especialidade.
A partir de então as contribuições têm sido inúmeras. Pode-se citar até 1960 os nomes de Jarussi e cols. Marcondes e cols., Melo e cols., Levoci, Barbato e cols., Borges e cols., Fugioka e cols., Lion, Granville e cols., Freitas e cols., Rigatto e cols. e muitos outros não menos importantes. Naquela época os estudos baseavam-se mais em parâmetros hemodinâmicos, como medidas de débito cardíaco e oximétricas e curvas de pressão de cavidades e vasos, e quase nada em imagens dinâmicas. O estudo de um paciente mitral, por exemplo, durava três, quatro horas, medindo-se pressões, consumo de oxigênio e débito cardíaco em repouso e exercício, esgotando-se as possibilidades de investigação fisiopatológica. Embora já estivesse em uso à angiocardiografia (não a cineangio) no nosso meio, esse exame era reservado só para cardiopatias congênitas. Compensava-se a falta de cateterismo e angiocardiografia nesses casos por um completo estudo fisiológico, o que possibilitava precisas indicações cirúrgicas. Cine a parte, do ponto de vista hemodinâmico, os pacientes eram mais completamente investigados que hoje em dia.
Em 1966, no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, em São Paulo, José Eduardo M. R. Souza realizava a primeira cinecoronariografia no Brasil, sendo que dentro dos próximos dezoito meses diversos grupos já publicavam suas experiências com esse método diagnóstico.
Em 1971, ela primeira vez no mundo, também no Brasil, Galiano e cols. realizaram uma recanalização mecânica de coronária, passando um cateter diagnóstico de Sones por um trombo oclusivo localizado numa coronária direita, melhorando o paciente que se encontrava em choque cardiogênico.
A partir da década de setenta houve uma verdadeira explosão de centros diagnósticos no nosso país voltados para a investigação de coronariopatias por meio de cateterismo cardíaco, popularizando-se no meio médico o estudo hemodinâmico e cineangiocoronariográfico. O aperfeiçoamento da técnica fez aumentar as áreas de estudo das diversas cardiopatias (congênitos, valvulares, miocardiopatas, principalmente coronariopatas) Assim como o número de publicações e de interessados no método e de seus praticantes, que passaram a ser chamados de “hemodinamicistas” ou de “angiocardiografistas”.
Evento marcante para o maior desenvolvimento da hemodinâmica e do cateterismo cardíaco no nosso país ocorreu em 10 de julho de 1975, quando, por ocasião do 31ª Congresso Brasileiro de Cardiologia, durante Assembléia Geral Ordinária da Sociedade Brasileira de Cardiologia, foi criado o Departamento de Hemodinâmica e Angiocardiografia (DHA) da mesma e que, no dia 2 de dezembro de 1976, realizou seu primeiro Congresso em Guarujá, São Paulo.
Em 1979, foi realizada a primeira angioplastia coronariana no Brasil, em Curitiba, por Costantino Costantini e cols., utilizando a técnica original de Gruentzig num paciente de 55 anos. Logo a seguir, Eduardo Souza e cols., no Dante Pazanese, Siguemituzo Arié e cols., no INCOR, ambos em São Paulo, Carlos Gottschall e cols., no Instituto de Cardiologia de Porto Alegre, e outros passaram a empregar a técnica de maneira crescente no nosso país.
Em 1981, iniciava-se a reperfusão coronariana no infarto agudo do miocárdio, com injeção intracoronariana de estreptoquinase, no INCOR, em São Paulo, por Giovani Bellini e cols., e depois expandida também para a via sistêmica por Lélio A. Silva e cols.
Em 1982, Carlos Gottschall e cols. apresentaram o primeiro caso brasileiro, com sucesso, de recanalização por angioplastia de coronária cronicamente ocluída.
Em 1983, foi efetivada pela primeira vez no Brasil, por Valmir F. Fontes e cols., uma valvuloplastia pulmonar para tratamento da estenose pulmonar congênita, com sucesso, abrindo caminho para a expansão da indicação de tratamento por cateter de outras formas de cardiopatias congênitas.
A partir da metade da década de oitenta, generalizou-se o uso da angioplastia coronariana para recanalização mecânica e tratamento da fase aguda o infarto do miocárdio bem como a realização de angioplastias de múltiplos vasos.
Em 1986, Eduardo Souza e cols. implantaram pela primeira vez no Brasil, com sucesso, um stent de Palmaz-Schatz num homem, e em 2001 publicaram o primeiro relato internacional mostrando que stents “revestidos” com drogas, no caso a Rapamicina, praticamente anulam a reestenose coronariana, o “calcanhar de Aquiles” da angioplastia.
Em 1991, foi criada a Central Nacional de Intervenções Cardiovasculares (CENIC), um banco de dados oficial alimentado voluntariamente por sócios titulares habilitados em intervencionismo cardiológico pelo DHA, para documentar o desempenho e a evolução da especialidade no Brasil, presidido pela Dra. Amanda Guerra Souza, e que vem fornecendo preciosas informações para monitoração e orientação dos processos intervencionistas.
Com tamanha expansão da hemodinâmica e cardiologia intervencionista no mundo e no nosso país, os “hemodinamicistas” e “angiocardiografistas” começavam a ter vôo próprio, praticamente independente da cardiologia clínica. Há muito suas atividades não se voltavam só para os estudos fisiopatológicos e diagnósticos mas se dirigiam principalmente para a terapêutica intervencionista das cardiopatias. Assim, em 1993, em Belo Horizonte, por ocasião do 49º Congresso da Sociedade Brasileira de Cardiologia, fundou-se a Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista (SBHCI), decidindo-se que todos os integrantes do DHA da SBC passavam a ocupar ativa e retroativamente idênticos títulos e posições que ocuparam, ocupassem ou viessem a ocupar ao longo da existência do DHA da SBC. Nessa ocasião começou a ser publicada a Revista Brasileira de Cardiologia Invasiva, órgão científico oficial da SBHCI, sendo seu primeiro editor Marco Antonio Perin.
Stents Não Farmacológicos
A partir do final da década de 1980, o advento dos stents para o tratamento de obstruções no leito coronário revolucionou a terapêutica da doença aterosclerótica, reduzindo a ocorrência de reestenose em até 30% quando comparada ao cateter balão. Entretanto, o implante desses dispositivos exacerba a resposta inflamatória intracoronária, dando início a uma cascata reparatória local. Em alguns casos, essa cascata pode resultar em hiperproliferação neointimal, cuja tradução clínica mais comum é a reestenose (definida como presença de estenose do diâmetro ≥ 50% no segmento tratado no acompanhamento angiográfico tardio) que, a depender dos cenários clínicos e angiográficos, pode ocorrer em até 20-30% dos casos após o uso de SNF. Mesmo com as mudanças no desenho, o desenvolvimento de plataformas mais finas e a utilização de novas ligas metálicas, a reestenose persiste como principal limitação desses dispositivos.
Stents Farmacológicos
Desenvolvidos no final dos anos 1990, os Stents Farmacológicos resultam da combinação de uma plataforma metálica com um fármaco antiproliferativo, em geral carreado ao sítio da lesão por meio de um polímero, que controla a cinética de liberação do agente antiproliferativo. A primeira geração desses dispositivos, representada pelos stents com sirolimus (Cypher – Cordis, Miami, Estados Unidos) e paclitaxel (Taxus – Boston Scientific, Natick, Estados Unidos), montados em plataformas de aço inoxidável e com polímero durável, demonstrou, em diversos estudos randomizados e metanálises, reduzir em 50-70% a necessidade de novas intervenções na lesão alvo (reestenose clínica), comparativamente aos stents não farmacológicos necessitando menos de 10 pacientes tratados para demonstrar o benefício.
SERVIÇO DE HEMODINÂMICA DO HOSPITAL MADRE TERESA CARDIOLOGIA INTERVENCIONISTA E RADIOLOGIA VASCULAR
Em abril de 1987, com a instalação do Serviço de Cardiologia e Cirurgia Cardíaca no Hospital Madre Teresa, identificou-se a necessidade de instalar um equipamento de Hemodinâmica, área a ser coordenada pela Dr. Marcos Antonio Marino.
As atividades tiveram início em maio de 1990, com a aquisição do equipamento Siemens Angioskop, considerado de vanguarda para a época uma vez que, possuía o sistema “Tape” que permitia rever as imagens ainda durante o procedimento, sem a necessidade de aguardar a revelação do filme para visualização.
A inauguração do Serviço contou com o apoio da Diretoria do HMT e com a presença do Dr. Zerbini e Dr. Sigmatuso Ariê, coordenadores dos serviços de cirurgia cardíaca e hemodinâmica do INCOR-SP, respectivamente.
O Serviço de Hemodinâmica prosperou, recebendo um segundo equipamento (Toshiba) em 1994, a primeira sala de Hemodinâmica com angiografia e subtração digital do Brasil. Esta aquisição permitiu realizar angiografias cerebrais e periféricas assim como evoluir na angioplastia coronária. A estrutura implantada permitiu que o serviço acompanhasse a evolução técnico-científica mundial e realizasse procedimentos endovasculares e terapêuticos avançados à semelhança dos serviços de referência no exterior.
Permitiu ainda a realização de angioplastias das artérias carótidas e renais, após estágio do Dr. Marcos Marino no Saint Vincent Hospital, Indianápolis (1995). A partir de 2003 iniciamos o implante de Stents farmacológicos. Desde a implantação do serviço em 1990 até o ano de 2022 foram realizadas cerca de 20.000 angioplastias e 200.000 exames diagnósticos.
Merece destaque a formação de médicos especialistas na área de atuação em Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista, assim como a realização de inúmeros trabalhos científicos publicados em periódico Nacionais e Internacionais, e participação em relevantes estudos clínicos: COBALT, OASIS-2, CURE, ASSENT-2, ASSENT-3, ASSENT-4 PCI, SYNERGY, CURRENT- OASIS-7, XIENCE V, TRILOGY ACS, E-NOBORY, PEGASUS, AEGIS-II, EMPACT ……
Ainda, na atuação de vanguarda em Minas Gerais, iniciamos o tratamento das doenças estruturais cardíacas em parceria com a equipe de Cirurgia Cardíaca, estruturando um “HEART TIME”. No período de 2013 a 2022 foram realizados 459 procedimentos de Implante Percutâneo de Válvula Aórtica (TAVI).
A atuação integrada das equipes de Hemodinâmica, cardiologia clínica e cirurgia cardíaca completa 36 anos de atuação no hospital Madre Teresa, fiel aos seus princípios da no nossa MISSÃO: Acolher, diagnosticar, cuidar com humanização e excelência em cardiologia e prover conhecimento médico integrado.
VALORES: Ética, valorização de pessoas, atualização científica e tecnológica, colaboração e trabalho em equipe.
Em 1995 desenvolvemos um programa de informática, o POWERMED, para cadastrar os pacientes por patologia e tipo de procedimento, e a partir de 1996 iniciamos o cadastro dos casos de angioplastia das artérias coronárias, carótidas, renais, mesentéricas e periféricas, denominado Registro Madre Teresa (REMAT), que nos possibilita diversas análises estatísticas.
Apresentamos abaixo dados obtidos do nosso registro REMAT referentes às angioplastias do período 01/01/1996 à 31/12/2022.
Para fins didáticos classificamos as angioplastias coronárias da seguinte maneira:
ANGIOPLASTIA PRIMÁRIA quando realizada na fase aguda do infarto com elevação do segmento ST (IAMCEST) preferencialmente nas primeiras 12 horas pós-infarto e até 24 horas na persistência de sintomas.
ANGIOPLASTIA CONVECIONAL PÓS INFARTO para aquelas realizadas na fase aguda ou em evolução (até 7 dias pós infarto) ou em cicatrização (de 7 a 28 dias pós infarto) de acordo com a IV definição de infarto do miocárdio. Esses pacientes receberam ou não tratamento com fibrinolítico e a angioplastia foi direcionada para tratamento da artéria culpada ou não culpada, não sendo incluídos os pacientes de angioplastia primária.
ANGIOPLASTIA DE RESGATE naqueles que foram submetidos ao tratamento com fibrinolítico sem sinais de reperfusão e persistência de sintomas.
ANGIOPLASTIA CONVENCIONAL para aqueles submetidos à angioplastia de forma eletiva com ou sem implante de Stent, que são a grande maioria dos procedimentos.
Embora a angioplastia primária seja a melhor forma de reperfusão coronária no infarto agudo do miocárdio com elevação do segmento ST (IAMSEST) ele representa muito pouco do ponto de vista de saúde publica. Estima que no Brasil apenas 1% dos pacientes com IAMCEST tem oportunidade de receber esse tratamento.
Assim o uso de fibrinolítico tem papel importantíssimo no tratamento do IAMCEST pela possibilidade de administração em larga escala. De acordo com o nosso Banco de dados menos da metade dos pacientes com IAMCEST encaminhados para o Hospital Madre Teresa receberam este tipo de tratamento.
Hospital Madre Teresa
Angioplastias coronárias.
Com essa visão geral das angioplastias coronárias realizadas no período de 1996 a 2022 vamos detalhar as angioplastias coronárias realizadas no ano de 2022.
Em relação a idade observamos no nosso banco de dados uma mudança cronológica importante nos pacientes submetidos a angiopalstia coronária. Em 2010 a idade média de 739 paciente analisados era de 63,46 anos DP 12,10 em 2022 encontramos a idade média de 69,64 anos Com DP de 11,06. Da mesma forma a idade média dos pacientes submetidos a angioplastia primária em 2010 era de 61,1 anos em 2022 essa idade aumentou para 65,83 anos.
Angioplastia convencional para aqueles submetidos à angioplastia de forma eletiva com ou sem implante de Stent, que são a grande maioria dos procedimentos. Distribuição dos pacientes pela faixa etária em décadas.
Angioplastia primária quando realizada na fase aguda do infarto preferencialmente nas primeiras 12 horas pós infarto e até 24 horas na persistência de sintomas. Distribuição dos pacientes pela faixa etária em décadas.
Em relação ao número de vasos tratados a grande maioria foi realizado a angioplastia de um único vaso (angioplastia uniarterial) seguido das angiopalstias multiarterial em tempo único (angioplastia de 2 ou mais vasos tratados simultaneamente) e as angioplastias multiarterial em tempos diferentes quando foi abordado 1 ou mais vasos em um periodo por nos estipulado de 3 meses ou seja até 3 meses após o primeiro procedimento.
Palavras Chave: Infarto, Angioplastia, Stents, Hospital Madre Teresa, Cirurgia, Hemodinâmica, Hemodinamicista, doença coronária, Fibrinolítico, Angioplastia primária.