Dr. Flávio Luiz de Aguiar Martins
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Dados da literatura científica sugerem que o horário de administração de anti-hipertensivos pode exercer influência na eficácia do controle dos níveis pressóricos bem como na prevenção dos eventos cardiovasculares relacionados à hipertensão arterial.

Em decorrência do ritmo circadiano, o pico da atividade do sistema renina-angiotensina-aldosterona, por exemplo, ocorre durante o sono. Ensaios clínicos prospectivos e meta-análises já demonstraram que as médias pressóricas durante o período do sono, durante a monitorização ambulatorial da pressão arterial (MAPA), é um marcador mais sensível do risco cardiovascular do que as médias pressórica obtidas na MAPA durante a vigília ou no período de 24 horas.

Estudos como Heart Outcomes Prevention Evaluation (HOPE), Syst-Eur, Syst-China e Controlled Onset Extended-Release Verapamil Investigation of Cardiovascular Endpoints (CONVINCE) avaliaram os efeitos da ingestão vespertina ou noturna de anti-hipertensivos na redução de risco cardiovascular. Porém, nenhum destes estudos foi conduzido comparando a administração vespertina ou noturna de anti-hipertensivos com a administração no período da manhã.

Recentemente foi publicado o Hygia Chronotherapy Trial, no qual 19.168 pacientes foram randomizados para o uso de anti-hipertensivos ao despertar ou para o uso noturno de anti-hipertensivos. Os participantes do estudo receberam a dose total de pelo menos um agente anti-hipertensivo das cinco classes terapêuticas principais (inibidores da enzima conversora de angiotensina, bloqueadores de receptores da angiotensina, bloqueadores dos canais de cálcio, beta-bloqueadores e/ou diuréticos) no período noturno (9552 pacientes) ou ao despertar (9532 pacientes).

Terapias anti-hipertensivas combinadas foram prescritas, quando disponíveis, em uma única apresentação galênica, para melhor aderência. Durante o período de acompanhamento dos pacientes (mediana de 6,3 anos de seguimento), 1.752 participantes do estudo apresentaram eventos cardiovasculares maiores, como Infarto do Miocárdio, necessidade de revascularização miocárdica, Acidente Vascular Encefálico ou morte cardiovascular.

Pacientes alocados no grupo de administração noturna de anti-hipertensivos tiveram redução de risco destes eventos cardiovasculares de 45%.

A redução de risco ocorreu independentemente de fatores como sexo, idade, tabagismo, tratamento anti-hipertensivo à inclusão no estudo, níveis pressóricos normais a elevados durante a vigília ou o sono, descenso pressórico noturno, presença de comorbidades como Diabetes Mellitus ou Doença Renal Crônica e registro de evento cardiovascular prévio. A redução dos níveis pressóricos durante o período noturno foi o principal preditor da redução de risco cardiovascular neste estudo.

Figura 1 – Curvas de Kaplan-Meier do risco cumulativo do desfecho de doenças cardiovasculares nos braços de administração de anti-hipertensivos pela manhã (azul) e no período noturno (vermelho) primário composto (A) Desfecho de doenças cardiovasculares: morte cardiovascular, Infarto do Miocárdio, necessidade de revascularização miocárdica, Insuficiência Cardíaca e Acidente Vascular Encefálico. (B) Eventos cardiovasculares totais: morte cardiovascular, Infarto do Miocárdio, necessidade de revascularização miocárdica, Insuficiência Cardíaca, Acidente Vascular Encefálico, Angina de Peito, Doença Arterial Periférica e Ataque Isquêmico Transitório.

O uso da dose diária de pelo menos um medicamento anti-hipertensivo no período noturno resultou tanto no melhor controle pressórico no período noturno quanto na redução significativa da morbimortalidade cardiovascular.

Embora seja mais freqüente a administração de anti-hipertensivos pela manhã, a adoção da estratégia terapêutica da administração noturna de anti-hipertensivos foi segura e efetiva, sem aumento dos efeitos adversos dos anti-hipertensivos, em comparação à estratégia de uso de anti-hipertensivos ao despertar. 

Ref.: European Heart Journal(2019) 0,1 – 12.